Notícias de médicos que abusam de pacientes mulheres, durante o exercício de sua atribuição profissional, estão se tornando cada vez mais recorrentes.
Não estamos falando “somente” de violência contra mulheres, mas do uso da profissão para tirar ou tentar tirar proveito de mulheres, no âmbito da relação profissional-paciente.
Grande parte das mulheres já sofreu alguma espécie de violência de gênero, ou seja, uma agressão física ou psicológica que ocorre essencialmente pelo fato de ser mulher.
A violência obstétrica se revela como mais uma das violências de gênero que afetam as mulheres e cujos casos vem aumentando de forma muito expressiva.
Entende-se por violência obstétrica qualquer prática abusiva, desrespeitosa ou coercitiva que ocorre durante o atendimento obstétrico, desde a preconcepção, passando pela gestação, parto e pós-parto.
O termo se tornou popular ao ser relacionado aos procedimentos invasivos, desnecessários ou não autorizados que podem ocorrer durante o trabalho de parto, mas a verdade é que a violência obstétrica vai muito mais além.
Listamos aqui alguns exemplos do que pode ser considerado violência obstétrica e que inferem diretamente na saúde mental materna:
- Qualquer exame ou procedimento realizado no corpo da mulher sem o seu consentimento, o que pode ser desde um toque físico até uma conduta cirúrgica;
- Informação insuficiente ou inadequada, ou seja, deixar de comunicar ou não comunicar de forma clara sobre as opções existentes de tratamento e intervenções;
- Manipulação psicológica. A utilização do argumento de que se trata de profissional habilitado e especializado para tentar induzir a mulher à diferentes práticas, sem qualquer relação com a sua condição médica ou justificativa científica;
- Conduta vexatória por meio de violência verbal ou física capaz de causar dano físico e/ou psicológico à mulher, como gritar, xingar, não permitir a presença de um acompanhante, etc.
Qualquer mulher que tenha passado por violência obstétrica, ainda que não tenha certeza sobre a sua concretude, pode denunciar e deve procurar ajuda!
Existem três esferas diferentes de apuração da conduta: administrativa, cível e criminal.
No âmbito administrativo, se a violência foi cometida em ambiente hospitalar ou serviço de saúde, é possível realizar denúncia nos órgãos de ouvidoria das instituições de saúde. Se a violência ocorreu durante utilização do sistema público de saúde, é possível procurar pela Secretária de Saúde Municipal ou Estadual. Em todos os casos, o Ministério da Saúde também pode receber denúncias, vez que a saúde é obrigação do Governo Federal e as entidades particulares atuam como cessionárias deste dever do ente público.
Os conselhos regionais de medicina também estão aptos a receber denúncias e tem obrigação de instaurar procedimento investigativo. As punições variam de suspensão, multa, até a perda da habilitação profissional.
Já no âmbito criminal, a mulher pode procurar por uma delegacia da Polícia Civil e registrar Boletim de Ocorrência. Pode, também, procurar o Ministério Público e oferecer a denúncia diretamente a um Promotor de Justiça. Em algumas comarcas existem, inclusive, promotorias especializadas que atuam na defesa dos direitos das mulheres ou da saúde.
A punição decorre do processo judicial e será apurada de acordo com a tipificação penal do ato, que podem variar desde crimes mais brandos como injúria, difamação, cujas penas podem ser reduzidas às multas e prestações de serviços, até crimes mais graves como assédio sexual, lesão corporal, estupro, violação sexual mediante fraude, cujas penalidades mais severas podem resultar na reclusão do agressor.
Por fim, na esfera cível, a mulher pode buscar pela reparação do dano físico ou emocional. Nestes casos, necessitará do suporte jurídico de um advogado ou defensor público e a condenação geralmente envolve a indenização em valor pecuniário.
Outra opção que pode ser interessante é buscar organizações e instituições que prestam auxílio gratuito às mulheres e que podem lhes oferecer todas as orientações de como proceder, muitas vezes, até oferecendo suporte jurídico e psicológico.
Seja como for, toda violência obstétrica precisa ser denunciada! Denunciar ainda é a forma mais eficiente de contribuir para que novos casos não aconteçam, seja pela punição dos abusadores ou mesmo pela coibição de novas práticas abusivas.
Hylea Ferreira
mãe, advogada especialista em Direito Previdenciário pela UEL, criadora de conteúdo materno-infantil pelo instagram @multiversomae e representante em Londrina da Campanha Maio Furta-cor. Co-fundadora do Projeto Dilemas Maternos junto ao Sesc-PR.
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